Resumo: Na maioria dos estudos, nos tornamos visíveis não através de nossas próprias autopercepção e autodeterminação, mas sim através da percepção e do interesse político da cultura nacional branca dominante, como é observável na maioria dos estudos e debates sobre racismo (Kilomba, 2019). A realidade experienciada do racismo, as experiências, a compreensão e os sentimentos dos negros, assim como as cicatrizes psíquicas que o racismo nos causa têm sido amplamente negligenciadas (Essed, 1991). Ao contrário desse quadro, a proposta do presente trabalho parte da perspectiva de duas pesquisadoras negras e preocupa-se com as experiências subjetivas de mulheres negras. Neste sentido, o objetivo da discussão proposta pela mesa é promover um diálogo através de análises e reflexões sobre como padrões sociais e estereótipos afetam a percepção de mulheres negras sobre o processo de transição capilar e as expectativas de futuro profissional.
Iniciaremos apresentando dados sobre o processo de transição capilar obtidos por meio de uma revisão sistemática da literatura. A partir dos termos de busca “transição capilar” e “transitioning to natural hair” além de outros critérios de inclusão, foram selecionadas 16 produções, todas escritos por mulheres. A revisão permitiu observar que a transição capilar é um objeto de estudo recente em artigos, dissertações e teses e que estes definem esse processo de diferentes formas. Os objetivos desses estudos se dividem em duas direções: há aqueles que se voltam para o processo de transição capilar em si, seus significados, precedentes e efeitos e outros que buscam investigar a mulher negra, a partir da transição capilar e da relação com o cabelo. Como resultado, observa-se duas vertentes principais, os estudos que sugerem que a transição capilar é motivada por ou resulta em reconhecer-se como mulher negra e os estudos que sugerem que a transição capilar está relacionada a fatores diversos à questões raciais, como a autoestima. Por fim destaca-se que esses estudos não trazem uma maior caracterização das participantes, tais como cor da pele e textura do cabelo, o que poderia contribuir para uma maior compreensão do processo de transição capilar.
Posteriormente, apresentaremos uma pesquisa sobre os efeitos da ameaça dos estereótipos nas expectativas que mulheres negras estudantes universitárias possuem sobre seu futuro profissional pessoal e o futuro profissional de outras mulheres. Nesta pesquisa, avaliamos, através de um delineamento 3 x 2, as expectativas de carreira profissional de 331 mulheres estudantes universitárias de graduação e pós-graduação. Acreditamos que o risco de sentirem-se julgadas através de estereótipos e a valorização da categoria social iriam interferir nas expectativas de carreira profissional das estudantes. Os resultados indicaram que as estudantes demonstraram maior expectativa em relação ao seu próprio futuro profissional do que em relação ao futuro das mulheres, um efeito intensificado pela ativação do priming de ameaça dos estereótipos e de valorização da categoria.
Mulheres negras; transição capilar; carreira profissional