Resumo: Levando em consideração o recente cenário alarmante do trabalho análogo à escravidão, o qual apresenta, entre os anos de 1995 a 2021, cerca de 56.722 trabalhadores resgatados em condições análogas às de escravo[http://trabalho.gov.br/fiscalizacao-combate-trabalho-escravo/resultados-das-operacoes-de-fiscalizacao-para-erradicacao-do-trabalho-escravo] pelo estado brasileiro, a insistente recorrência de trabalhadores que são vítimas desse crime[ Cerca de 1,73% dos 35.341 trabalhadores resgatados entre 2003 e 2017 foram vítimas desse crime ao menos duas vezes segundo Dados do Observatório Digital do Trabalho Escravo no Brasil – https://www.ilo.org/brasilia/noticias/WCMS_616812/lang–pt/index.htm.] devida em muito a sua vulnerabilidade socioeconômica, o Projeto Vida Pós Resgate busca como objetivo contribuir com o Estado a adotar medidas de proteção e assistência às vítimas – uma responsabilidade do Estado prevista nos artigos 6.1 e 6.2 da Convenção Americana de Direitos Humanos e em tratados internacionais relacionados -, por meio da inserção dos trabalhadores resgatados em um sistema produtivo sustentável de forma autônoma (preferencialmente em seus locais de origem), com recursos oriundos das Ações Civis Públicas ou dos Termos de Ajuste de Conduta, em regime de trabalho familiar ou associativo, sem vínculos de subordinação. Desse modo, os trabalhadores deixariam de depender da conjuntura do mercado de trabalho para sobreviver e manteriam sua trajetória de vida ligada às atividades rurais, em condições autônomas, rompendo com o ciclo vicioso do trabalho análogo a de escravo.
Aponta-se ainda, segundo a pesquisa feita pela Organização Internacional do Trabalho (2011), que todos os trabalhadores resgatados tinham em seu histórico trabalho infantil, pobreza e/ou analfabetismo/baixa escolaridade/pouca qualificação. A grande maioria havia se deslocado de seu estado de origem. E 84% dos trabalhadores que vivem hoje na cidade tinham origem na área rural. Contudo, tal mudança não é recente, pois 90% destes estão há 5 ou mais anos na cidade e 44% há 10 anos ou mais. Dentro desta pesquisa, em entrevista com os trabalhadores resgatados, ao perguntar-lhes “qual seria a solução para o problema deles (trabalhadores)”, as respostas apontadas foram: a) ter terra para plantar (46,10%); b) ter um comércio (26,90%); c) ter emprego rural registrado (13,50%); d) ter um emprego na cidade (13,50%). Somando-se as indicações “a” e “c”, 59,60% dos trabalhadores resgatados em condição análoga à de escravo almejam o trabalho na terra[Perfil dos principais atores envolvidos no trabalho escravo rural no Brasil / Organização Internacional do Trabalho. Brasília: OIT, 2011. Acesso em: https://www.ilo.org/brasilia/publicacoes/WCMS_227533/lang–pt/index.htm].
Isso posto, o Projeto se justifica na medida em que, tendo em vista que o perfil do trabalhador resgatado mostra uma intensa ligação do trabalho análogo ao de escravo com a extrema pobreza/marginalização social, busca diminuir a vulnerabilidade social dos trabalhadores resgatados ao instituir um meio de geração de renda que dê autonomia aos trabalhadores por meio do trabalho na terra e com um formato produtivo salubre tanto aos trabalhadores e quanto ao meio ambiente. Tal formato produtivo se enquadra na atividade agrícola e pecuária via Sisteminha da EMBRAPA. Por meio desse sistema produtivo se espera que os beneficiários tenham como produzir ecomercializar seus produtos, garantindo um preço justo, possibilitando que o produto chegue ao mercado com agilidade e a qualidade higiênico-sanitária exigida pelos órgãos fiscalizadores e pelo mercado consumidor.
Dado que o projeto está amparado pelas normas nacionais, internacionais e pelas obrigações assumidas pelo Estado brasileiro quanto à erradicação do trabalho análogo ao escravo no País, e tem como instituições executoras o Ministério Público do Trabalho ea Universidade Federal da Bahia, por meio do Grupo de Estudos em Economia Política e Desenvolvimento (GEPODE), e ainda conta com a parceria da Prefeitura de Aracatu, essa solicitação se justifica-se também pela responsabilidade social e confiabilidade que tal arranjo institucional apresenta.
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